sábado, 12 de junho de 2010

A arte de envelhecer

Freguês dos anos há mais de 42 anos, ultimamente tenho escutado de outros consumidores do tempo que envelhecer, além de não doer é, sobretudo, uma arte.

Quanto a assertiva de não fazer doer o peso dos anos, me parece não restar outra alternativa senão a de me contrapor, peremptoriamente, a essa afirmação pra lá de cavilosa, o que não posso fazer o mesmo com a correlação comparativa entre a arte e o ato de envelhecer.

De fato, o inevitável envelhecer é uma arte na mais legítima concepção da palavra e com suas mais amplas variações, todas elas, inclusive, passíveis de diagnósticos: artrite, artrose, arteriosclerose, e por aí vai, dentre outras tantas artes. Há até uma incisiva campanha publicitária, nos consultórios médicos, claro, de que a “velhice é a melhor idade”, ao menos para os geriatras e profissionais da área por que para mim ela tá chegando a galope, acompanhada de mala e cuia.

Veio para ficar. Sem convite nem apresentações, foi se instalando de mansinho, ocupando alguns espaços vazios, ora habitando um quarto, às vezes, um ombro, a coluna. Devagarinho foi ficando, se acomodando, puxando uma cadeira, uma dorzinha do tipo vou ali mais volto, de tal modo que vai se sentindo em casa e não há especialidade médica, vassoura atrás de porta nem mandinga que dê jeito. Veio para ficar. Mesmo a contragosto, já me preparei para o chinelão de dedos, pijama de bolinhas, sopa e papinha de aveia.

Outro dia, passando ali ao lado do Pombal Ideal Clube descobri que o meu novo time está até organizado, talvez até precisando de um zagueiro. Ali, pendurado numa faixa pude ler em letras garrafais: “Clube da Melhor Idade”, faltando apenas o complemento que na ocasião julguei necessário: “proibido para menores de 65 anos”, imaginei.

Mas, a bem da verdade, a velhice não é apenas dores e limitações. Há espaços para outras coisinhas mais, principalmente saudades, reminiscências, aventuras vividas outras apenas imaginadas, trilhas de rugas desenhadas pelos anos e uma incontrolável vontade de realizar tudo de novo; empreender planos, voltar no tempo, brincar de bila, bodé berrou, garrafão, baleado, pular macaca, cair no poço, esconde-esconde, cometer novos erros (há tantos para serem cometidos e à nossa espera), pedalar a minha Monareta Monark azul, deslizar pela calçada da Getúlio Vargas no velho patinete de madeira e rolamento, tomar banho de chuva nas tardes do sertão, correr ao vento sem se importar com a responsabilidade do tempo nem com os compromissos da vida. Sonhar, verdadeiramente perde-se no sonho!

Os anos, porém, apressam nossos relógios, nos fazem mais adultos, sisudos, e a velhice faz questão de nos lembrar disso. Que bom seria se o tempo esquecesse de nós!

Isso tudo me remonta a conclusão de que tinha razão o inconfundível filósofo Facundo de Paiva Santana, ex-morador da Rua do Comércio. Para ele, duas sentenças eram irretocáveis e incorrigíveis: “nada é para sempre. Para morrer basta estar vivo” e “doutor é somente aquele que opera”, textualizava ele.

É amigo Facundo..., a saudade também é uma forma de permanecer vivo, e ultimamente tenho tido incontidas recordações, inclusive de mim.


Teófilo Júnior

4 comentários:

Unknown disse...

O que é envelhecer afinal ??? ter rugas ? ver cair os dentes e os cabelos com o passar do tempo? Acho que a velhice vai além disso! Começamos a envelhecer de fato, quando observamos a vida e o nosso eu interior, e percebemos que tudo já não tem um doce sabor....qunado os anos vão passando e vai se chegando a conclusão que algo em nós já não é o mesmo....nem o sorriso...nem o olhar...e principalmente as pessoas...inclusive nós! Sei que é difícil perceber que com o tempo, estamos perdendo a saúde; mas, para mim, a gente envelhece mesmo quando deixa enrugar o espírito!!! :(

Unknown disse...

SE OBSERVARMOS BEM,.........NÃO É O TEMPO QUE PASSA,....NÓS É QUE PASSAMOS!!!

Unknown disse...

SE OBSERVARMOS BEM,.........NÃO É O TEMPO QUE PASSA,....NÓS É QUE PASSAMOS!!!

Jairo Alves disse...

Muito bonita a crônica!
Só conseguiu descrevê-la porque conseguiu antes assistí-la...

Também uma verdade o que Dagvan comentou a esse respeito.

Nós, bem que sabemos envelhecer,
De tal forma a não enxergamos,
Que a todo custo, que sonhamos,
Não custamos nada em perder...

Um dia veio, entre as mil maneiras,
Mas só a de pensar que estamos
É a que mais grave nos restamos,
Um minuto, dez dias de brincadeiras...

E assim por quem mais aprove,
A quem se entrega a moldura,
É sim, quem mais tem postura,
E a pouco a ver, de que a se move.

Mas não sabemos bem morrer,
Nem tão pouco, a hora da morte,
Sabemos darmos corda a sorte,
E esta a encurtar e a de nos perder...


13 de junho de 2010.