terça-feira, 26 de novembro de 2013

Disco arranhado

Houve um tempo em que música vinha gravada em discos de vinil. Ou como preferem alguns, em LPs. A gravação era analógica. A música vinha impressa em um material plástico chamado vinil (normalmente feito de PVC), usualmente de cor preta, que registrava as informações de áudio, destinadas a serem reproduzidas através de um toca-discos.
 
O disco de vinil era caprichoso e delicado. Qualquer arranhão pode tornava-se uma falha, e comprometia a música. Precisavam ser constantemente limpos, estar sempre livres de poeira, e guardados sempre na posição vertical e dentro de sua capa e envelope de proteção, longe da poeira.
 
A falta de zelo um convite a que a qualidade da música gravada fosse comprometida por arranhões que, lamentavelmente, condenavam a repetir, eternamente, a mesma parte da música. Como espectadores do castigo de Sísifo, o ouvinte era condenado a ouvir a repetição infrutífera de tarefa inútil. Situação frequentemente resolvida com um golpe, na medida certa, no toca-discos.

Hoje em dia, na era digital, às vezes a gente se sente ouvindo disco arranhado. Parece que as notícias se repetem no sentido, forma e frequência. Como disco arranhado. Tudo parece ser notícia de ontem. Ou às vezes de anteontem.
 
Quando se acredita que o assunto acabou, lá vêm mais rios de tinta para dizer mais do mesmo. No mesmo tom. Com o mesmo ritmo. Com os mesmo interpretes. Com as mesmas ideias. E sem ao menos uma centelha de novidade que de para capturar a atenção, ou que sirva para dar sentido à repetição do assunto.
 
Já é tempo de dedicar estes rios de tinta a assuntos novos. De entregar a história os assuntos passados. A gente já entendeu que cumprir pena, por definição, não é agradável nem, do ponto de vista de quem a cumpre, desejável. Penas não foram feitas para deixar condenados felizes. A gente sabe. Mas não da para ouvir disco arranhado o tempo todo.
 
O toca-discos precisa de uma pancada, na dose certa, para que a música siga em frente. Quem sabe a música que vem em seguida agrade. E se não agradar, da sempre para trocar de disco.
É hora de virar a página.
 
 
Elton Simões mora no Canadá. Formado em Direito (PUC); Administração de Empresas (FGV); MBA (INSEAD), com Mestrado em Resolução de Conflitos (University of Victoria). E-mail: esimoes@uvic.ca

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