sábado, 19 de novembro de 2016

Detalhes


Faixa de abertura e principal destaque do disco que lançou em 1971, esta balada devastadora funcionou como um rito de passagem na carreira de Roberto Carlos (1941). Aos 30 anos, ele começava a deixar para trás o ídolo da Jovem Guarda para se transformar no maior cantor romântico brasileiro. Sucesso popular imediato e até hoje uma das mais amadas pelo seu público, a canção também ganhou aplausos unânimes da crítica, que na época ainda costumava desmerecer e subavaliar a obra de Roberto e Erasmo. 

Mais um fruto da parceria com Erasmo Carlos (1941), a letra da música, em forma de list song, lembra os pequenos mas tão importantes detalhes que marcam as lembranças felizes de um amor passado, mas ainda vivo: “a velha calça desbotada”, “os erros do meu português ruim”, “o ronco barulhento do meu carro”... e a advertência irônica “não vá dizer meu nome à pessoa errada”. 

Como conta o biógrafo proscrito Paulo César de Araújo no livro proibido Roberto Carlos em detalhes, apesar de ter consciência de que acabara de criar um clássico, movido por seu lendário perfeccionismo, Roberto implicou com a palavra “ronco”, por sua sonoridade bruta e possíveis outros sentidos pouco poéticos. E, até entrar no estúdio, testou a letra com diversos amigos, mas, como ninguém estranhou, o ronco ficou na história da música brasileira. 

Roberto começou a compor “Detalhes” sozinho, numa noite em março de 1971, em São Paulo, onde vivia na época. No dia seguinte, ao ouvir o rascunho que gravara, percebeu que estava diante de algo maior. Animado e ansioso, sem querer perder tempo e o momento da inspiração, ligou para Erasmo no Rio, que pegou o primeiro voo e naquela mesma tarde terminaram a canção. 

A inspiração e a intuição de Roberto não falharam. “Detalhes” nasceu clássica e conquistou instantaneamente todos que a ouviram e, meses depois, abriu o seu álbum do ano. Um de seus melhores discos, seu poderoso repertório incluía uma composição que Caetano fez para ele (“Como dois e dois”) e outras pérolas com Erasmo, como “Amada amante”, “Todos estão surdos” e “Debaixo dos caracóis dos seus cabelos”, dedicada a Caetano, então exilado em Londres, mas “Detalhes” foi a que bateu mais forte.
A gravação de Roberto foi valorizada por um sofisticado arranjo do maestro americano Jimmy Wisner, e a levada rítmica e a estrutura harmônica de “Detalhes” lançaram um modelo de canção que depois foi infinitamente imitado e explorado no Brasil. 


Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1971

(101 canções que tocaram o Brasil, Nelson Motta, Rio de Janeiro: Estação Brasil, 1. ed., 2016, p. 109.)

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