A Bíblia é mesmo um livro sui generis. Ela não encoberta nem explora
os escândalos de seus mais importantes personagens. Por essa razão,
todo mundo debaixo do Sol sabe da bebedeira de Noé (Gn 9.21), da mentira
de Abraão (Gn 20.2), do adultério de Davi (2 Sm 11.1-5), da
incredulidade de Tomé (Jo 20.24-25), da tríplice negação de Pedro (Mt
26.68-75) e da desavença entre Paulo e Barnabé (At 15.36-41). A Bíblia
não esconde nem o enfrentamento público de Paulo a Pedro, tido por
muitos como o primeiro chefe da igreja visível (Gl 2.11-21).
A
Palavra de Deus está cheia de escândalos sexuais. Já no primeiro livro
da Bíblia encontramos seis histórias chocantes. Os homossexuais de
Sodoma, “tanto os moços como os velhos”, cercaram a casa de Ló de todos
os lados para ter relações com os dois anjos nela hospedados (Gn
19.1-11). Pouco depois da destruição de Sodoma e Gomorra, as duas filhas
de Ló o embriagaram e se engravidaram do próprio pai (Gn 19.30-38). Uma
das filhas de Jacó foi violentada por um príncipe palestino e os irmãos
da moça, em vingança, mataram todos os homens de Siquém (Gn 34.1-31).
Mas os filhos de Jacó também não eram flores que se cheirassem: Rúben, o
mais velho, aproveitou-se da ausência do pai e se deitou com uma de
suas quatro esposas (Gn 35.22; 49.4). Judá, por sua vez, deitou-se com a
própria nora, certo de que se tratava de uma prostituta. Na ocasião,
ambos eram viúvos (Gn 38.1-31). A mulher de Potifar, oficial de Faraó,
só não cometeu adultério com o jovem administrador do marido porque José
tinha, diferentemente dos irmãos, uma sólida formação moral e religiosa
(Gn 39.7-23).
Por ocasião da travessia do deserto rumo à terra
prometida, o povo eleito caiu na cilada armada por mulheres moabitas a
mando de um adivinho chamado Balaão, que trabalhava para o rei Balaque.
Elas provocaram uma tremenda orgia coletiva associada aos sacrifícios a
seus deuses. A extravagância foi tal que envolveu 23 mil pessoas, que
foram mortas num só dia (1 Co 10.8). Um dos israelitas teve a audácia de
levar uma midianita para sua barraca no meio do arraial à vista de
Moisés e de toda a comunidade e com ela se deitar. O jovem sacerdote
Finéias, sobrinho-neto de Moisés, movido de intenso e justo zelo pelo
Senhor, pegou uma lança e foi atrás deles até a alcova, onde os
traspassou, o homem e a mulher (Nm 25.1-18).
Pouco antes do
início da monarquia, ainda na época dos juízes, houve outro escândalo
que redundou numa das maiores tragédias da história de Israel. Homens
bissexuais cercaram a casa de um idoso que havia hospedado um casal de
passagem pela cidade benjamita de Gibeá. O marido era levita e morava no
território de Efraim, e a esposa era de Belém da Judéia. Ele acabara de
se reconciliar com a mulher e a levava de volta para casa. À semelhança
dos homossexuais de Sodoma, esses rapazes de Gibeá bateram à porta do
idoso e pediram-lhe que trouxesse para fora o hóspede, porque eles
queriam ter relações com ele. Para livrar-se de tamanha loucura, o
levita entregou sua mulher à turba alvoroçada (atitude que revela a
inferioridade da mulher naquela época). Eles a forçaram e abusaram dela a
noite inteira. Então, ao amanhecer, a mulher voltou para casa, mas não
chegou a entrar, pois caiu morta com as mãos na soleira da porta. Porque
as autoridades da tribo de Benjamim não puniram os culpados, todas as
demais tribos de Israel se levantaram contra os benjamitas. O que
aconteceu em seguida foi uma guerra civil que tirou a vida de milhares e
milhares de israelitas e quase acabou com a tribo de Benjamim (Jz
19.1-21.25).
De todos os escândalos sexuais da história bíblica, o
mais conhecido é o adultério de Davi. O pecado desse servo de Deus foi
muito grave por várias razões. Ele tinha, até então, uma excelente
reputação e era amado e respeitado por todo o povo. Era a mais alta
autoridade da nação. Era um homem religioso por excelência e já havia
escrito não poucos salmos. Além do mais, ele se aproveitou da ausência
do marido de Bate-Seba, um oficial do exército que estava a serviço da
pátria. O adultério levou Davi a cometer outros pecados – o pecado da
hipocrisia e o pecado do assassinato do marido traído. Ele deu
oportunidade para os sempre presentes inimigos do Senhor blasfemarem
contra Deus. O mau exemplo de cima causou danos irreversíveis à família e
instaurou no país uma crise política e religiosa que durou mais de dez
anos (2 Sm 11.1-25).
Pouco depois do escândalo provocado pelo
rei, dois outros crimes sexuais foram cometidos na casa real. Amnon,
filho de Davi e Ainoã, estuprou a própria irmã, Tamar, filha de Davi e
Maaca. Esse crime provocou mais um crime: para vingar a irmã, Absalão
assassinou o meio-irmão Amnon (2 Sm 13.1-36). Poucos anos depois, quando
Davi foi obrigado a fugir de Jerusalém, Absalão, que tomou o trono do
pai, coabitou acintosamente, “à vista de todo o Israel”, com as mulheres
secundárias que Davi havia deixado para cuidar da casa (2 Sm 16.20-23).
Todos esses escândalos estão registrados nos livros históricos do
Antigo Testamento. No Novo Testamento, só se tem notícia de um escândalo
sexual. Trata-se de um irmão de Corinto que teve o atrevimento de
possuir a mulher de seu próprio pai (1 Co 5.1-8), o mesmo pecado de
Rúben com Bila.
O curioso é que não há nenhum sacerdote, profeta,
apóstolo, pastor, presbítero ou bispo envolvido em pecados sexuais na
Bíblia. Eles podem ter cometido outros pecados, mas não na área da
sexualidade.
Só há uma dolorosa exceção. Trata-se dos sacerdotes
Hofni e Finéias, filhos de Eli, que, no final do período dos juízes,
tinham uma conduta execrável. Além de explorarem o povo e de não lhe
darem assistência religiosa, os dois rapazes, embora casados, mantinham
relações sexuais com as mulheres que prestavam serviços religiosos na
entrada da tenda da reunião. Esse escândalo jogou toda a nação numa
situação vergonhosa diante das nações vizinhas. Deus retirou a sua
bênção e eles experimentaram derrotas sobre derrotas, até que Samuel os
levou ao arrependimento (1 Sm 2.12-26).
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